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Mostrando postagens de julho, 2018

O mito e o hoje - parte 2: a história de criança e a montanha-russa da vida adulta

ACESSE A PARTE 1:  CISÕES DO MITO NA PÓS-MODERNIDADE http://entredois-phmendonca.blogspot.com/2018/07/pensando-o-mito-parte-1-cisoes-do-mito.html             Na semana passada, tratamos de dois elementos da cultura moderna que vêm tomar o lugar do mito, morto em nossos ideais analíticos de racionalidade: a ciência, ambiciosa por descrever e explicar o mundo; e os sistemas econômicos, estruturas que organizam (mais ou menos coercitivamente) as relações. Mas, logo de início, havíamos tratado do mito em seu aspecto visceral, certamente não cumprido por estes dois elementos, a não ser para os cientistas entusiastas da academia e investidores ousados das bolsas de valores. Ora, o caráter emocional do mito caminha junto com outra de suas funções, que também tratamos na parte 1, a inserção dos novatos na cultura. Não há dúvida de que esta inserção está de mãos dadas com o lugar estruturante ocupado pelo mito, mas não ensinamos economia para nossas crianças na escola (a não ser algumas n

O mito e o hoje - parte 1: cisões do mito na pós-modernidade

           Creio que não se faz necessário começar aqui por uma ode ao pensamento mitológico, devolvendo-lhe seu valor, roubado por nossa avidez pela técnica – especialmente depois da crítica de Conhece-te a Ti Mesmo, mês passado¹. Reconhecendo seu valor, podemos pular um capítulo, para pensar mais propriamente do que estamos falando. O mito certamente não trata de trivialidades, não são historinhas para entreter. Também não tratam, ao contrário, de um estudo exaustivo e milimétrico do mundo ou de si. É visceral e emocional, como o entretenimento; mas fala de algo, como os estudos que nos acostumamos a fazer nos últimos séculos. Neste sentido, parece óbvia a conclusão mais comum: o mito descreve e explica o mundo. Mas isto não nos basta, pois caímos aqui em problemas epistemológicos semelhantes àqueles de que tratei no texto referido: podemos supor um mundo estável, externo e verdadeiro, anterior ao conhecimento?          É preciso ir além, é preciso entender os lugares epistemoló

As duas lições do espelho: da identidade à valoração

Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?              Antes da beleza, importa perguntar: espelho, espelho meu, sequer existo eu? Acontece que, para desgosto dos biólogos e geneticistas, não. Pelo menos não assim, não desde sempre, não num corpo biológico dado, não numa herança genética, não num desígnio divino anterior (e quem me conhece reconhecerá que, se digo isso, o tema vale outro texto). Com Heidegger, pensaremos que o ser do ser-aí “está sempre em jogo”, sempre em risco, a todo momento pode não ser mais; então será sempre uma tarefa, sempre um ter-de-ser. Mas mesmo esta tarefa está postergada num ideal de eu que orienta um destino a ser traç­ado. Não, nossa pergunta está ainda antes.             Buscar no olhar do espelho um ser que ainda não sou, um ser sempre incompleto, já está implicado no desejo e no ideal que me orientam em direção a um deus totêmico. Perguntar pela existência é, antes de perguntar “que(m) sou?”, perguntar “sou?”. Aliás, vale uma