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Mostrando postagens de julho, 2021

Subjetivação e ancestralidade: para fazer psicanálise em terras brasileiras

A história de nossa terra é uma história de sofrimentos. Sem dúvida, houve por aqui quem se deu bem no meio disso. É daí que saio, porque quem inventou o racismo foi o macho branco europeu, e quem o perpetua por aqui é um certo tipo que parece ter parado no tempo não ter saído do lugar. A pergunta é: o que faz com que até hoje a branquitude tenha medo da voz dos povos desde sempre silenciados? Comecemos pelo começo: quem inventou o racismo não é o mesmo português que o manteve por aqui. Quem, pra começo de conversa, se deu bem com essa história, voltou para casa - e levou junto nossa madeira, depois nosso açúcar, depois nosso ouro, depois nosso café. Quem instaurou o carrego colonial - como chama um pessoal que faz teoria a partir dos axés - voltou pra Portugal. Quem veio pra ficar, veio porque não era bem quisto lá. E a minha hipótese é que esse é o trauma fundante da violência da branquitude brasileira - nisso, talvez quem venha da história possa me ajudar a falar melhor. Sem panos q

Não sou homem nem mulher (e nem você!)

Começo de um título arriscado - e arriscado a começar de quem fala. Sim, porque quem fala não foge de uma ambiguidade inevitável dos semblantes. Mas também porque negar o semblante também pode ser um risco. Além de falso - já que o semblante é sempre uma meia-verdade - dizer que o que se performa é só uma fachada nos põe a um passo de dizer que não importa. E sim, homens e mulheres, ser homem ou ser mulher, ou outra coisa - tudo isso importa muito. Num ingênuo "não há homens e mulheres", é preciso não esquecer que a meia-verdade do semblante se materializa, e qualquer que seja este homem-mulher que não há, violências muito concretas operam a partir dele. Apesar dos riscos, insisto no título, especialmente no “e nem você!” porque não se trata propriamente dos semblantes. Bem sabemos que os semblantes (homem/mulher), as modalidades de gozo (fálico/Outro) e as respectivas fantasias (relação com o objeto) em nada se prendem uns aos outros. Ou, com Butler: a coerência sexo-gênero-

Do Falo a Outra fala*

Há sociedades de filiação uterina em que as mulheres detém as máscaras em que a coletividade se aliena. O pênis perde então muito de seu prestígio. É só no seio da situação apreendida em sua totalidade que o privilégio anatômico cria um verdadeiro privilégio humano. A psicanálise só conseguiria encontrar sua verdade no contexto histórico. (BEAUVOIR, 2019 [1949], p. 78) A teoria psicanalítica enuncia, portanto, a verdade sobre o status da sexualidade feminina, e da relação sexual. Mas ela para por aí. Recusando interpretar as determinações históricas de seu discurso [...], e particularmente o que infere a sexuação até o presente exclusivamente masculina da aplicação de suas leis, ela se mantém presa no falocentrismo, que pretende elevar a um valor universal e eterno. (IRIGARAY, 2017 [1977], p. 117) Lacan questiona esse esquema de significação. Ele apresenta a relação entre os sexos em termos que revelam o “eu” falante como um efeito masculinizado do recalcamento, que figura como um su