São Paulo, 10 de julho de 2020
À Terra das Cores,
“Ó, musa do meu fado, ó, minha mãe gentil”, já te escrevi o quanto me estranha ter tão forte meu lirismo português no mesmo corpo que se vê tão brasileiro. Parece-me agora mais doce pensar que não me estranha, mas que prova e ensina o valor da composição múltipla que te faz. Prova e ensina que emancipar a colônia não implica rancor da metrópole. Pelo contrário, este rancor nos ata mais ainda ao que há de colônia em nós: nos ata à nossa mágoa, à tentativa constante e infactível de reprimir nosso lirismo português, nossa saudade de um fado ao luar e até, por que não?, nossa ambição extravagante de navegar o além-mar.
Não me esqueço, Terra das Cores, do teu colorido, “os Tons, os Mil-tons, seus sons e seus dons geniais”, que tantos me compõem, e outros tantos acompanho. Não me esqueço da cor das matas e da magia das ervas, da força das águas que adentro me levas. Não me esqueço do solo sagrado, do corpo de santo, da rede tão farta, nem da santa do rio. Não me esqueço dos braços do Cristo, nem muito menos do axé da Bahia. Sobretudo, minha terra, não me esqueço das cores de Dan. Essas que nos teus cantos aflitos, pudeste preservar, para ensinar que duas serpentes fazem um arco só, e que todas as cores fazem um branco só.
Assusta - creio que nos assusta - que entre todas as cores haja a cor do sangue frio e da morte matada; dos braços de um cristo que não abraça, esmaga. Então, além de uma declaração de amor, esta carta é uma promessa. Uma promessa de todos os dias reverenciar as tuas cores, e abraçar, abraçar sempre mais… e, no quanto puder, ensinar a abraçar! Abraçar com os braços abertos do Cristo que recebe teu mar. Se “o verde é a esperança, o amarelo o desespero”, esta carta é uma promessa de não desistir do amor, porque “o azul traz a liberdade para os caboclos brasileiros”.
Com o axé e o amor destes pés tão brasileiros,
Sempre,
PH Mendonça
Comentários
Postar um comentário